Folha Paroquial 03.03.2024 — Domingo III Da Quaresma — Ano B

Missa

Os textos que apresentamos hoje são os do Domingo A que se podem escolher sobretudo quando há catecúmenos que fazem os escrutínios a partir do 3º domingo da Quaresma.

A sede, a rocha e a água

Escavo cisternas no meio do deserto em busca de água. Escavo fundo em mim poços de lodo e água estagnada. Corro pelo deserto de balde na mão em busca de um poço, uma fonte, um regato de água para saciar-me, devorado pela sede que é mais forte a cada passo.
Encontro um poço, um homem sentado num poço, uma rocha e uma vara. É meio dia, a luz intensa o calor abrasador. “Se conhecesses o dom de Deus e quem é Aquele que te diz: ‘Dá-Me de beber’, tu é que Lhe pedirias e Ele te daria água viva”; “donde Te vem a água viva?”; “aquele que beber da água que Eu lhe der nunca mais terá sede”; “Senhor, dá-me dessa água”.

LEITURA I Ex 17, 3-7

Naqueles dias, o povo israelita, atormentado pela sede, começou a altercar com Moisés, dizendo: «Porque nos tiraste do Egito? Para nos deixares morrer à sede, a nós, aos nossos filhos e aos nossos rebanhos?». Então Moisés clamou ao Senhor, dizendo: «Que hei de fazer a este povo? Pouco falta para me apedrejarem». O Senhor respondeu a Moisés: «Passa para a frente do povo e leva contigo alguns anciãos de Israel. Toma na mão a vara com que fustigaste o Rio e põe-te a caminho. Eu estarei diante de ti, sobre o rochedo, no monte Horeb. Baterás no rochedo e dele sairá água; então o povo poderá beber». Moisés assim fez à vista dos anciãos de Israel. E chamou àquele lugar Massa e Meriba, por causa da altercação dos filhos de Israel e por terem tentado o Senhor, ao dizerem: «O Senhor está ou não no meio de nós?».

Os que passaram o Mar Vermelho a pé enxuto e viram as águas amargas de Mara tornarem-se doces, têm dificuldade em acreditar que o Senhor lhes pode saciar a sede, uma vez mais, no meio do deserto. A vara de Moisés que abriu as águas do Mar Vermelho, também pode fazer sair água da rocha do Horeb, porque nele está o poder de Deus.

Salmo responsorial Sl 94 (95), 1-2.6-7.8-9 (R. cf. 8)

Ao entoar o salmo 94 somos convidados a ir à presença do Senhor, com alegria, para o aclamar, louvar e adorar, porque ele é o nosso Deus. Somos despertados para o exercício da escuta, para não acontecer como em Meribá e Massá, quando o povo desafiou o Senhor e o pôs à prova, preferindo reclamar em vez de abrir o coração para escutar.

LEITURA II Rm 5, 1-2.5-8

Irmãos: Tendo sido justificados pela fé, estamos em paz com Deus, por Nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual temos acesso, na fé, a esta graça em que permanecemos e nos gloriamos, apoiados na esperança da glória de Deus. Ora, a esperança não engana, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. Quando ainda éramos fracos, Cristo morreu pelos ímpios no tempo determinado. Dificilmente alguém morre por um justo; por um homem bom, talvez alguém tivesse a coragem de morrer. Mas Deus prova assim o seu amor para connosco: Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores.

Fomos justificados na morte de Cristo, porque ele morreu por nós apesar de sermos pecadores. E nele, pela fé, encontrámos a paz e a esperança, que brotam do amor de Deus derramado em nossos corações pelo Espírito Santo.

EVANGELHO Forma longa Jo 4, 5-42

Naquele tempo, chegou Jesus a uma cidade da Samaria, chamada Sicar, junto da propriedade que Jacob tinha dado a seu filho José, onde estava o poço de Jacob. Jesus, cansado da caminhada, sentou-Se à beira do poço. Era por volta do meio-dia. Veio uma mulher da Samaria para tirar água. Disse-lhe Jesus: «Dá-Me de beber». Os discípulos tinham ido à cidade comprar alimentos. Respondeu-Lhe a samaritana: «Como é que Tu, sendo judeu, me pedes de beber, sendo eu samaritana?». De facto, os judeus não se dão com os samaritanos. Disse-lhe Jesus: «Se conhecesses o dom de Deus e quem é Aquele que te diz: ‘Dá-Me de beber’, tu é que Lhe pedirias e Ele te daria água viva». Respondeu-Lhe a mulher: «Senhor, Tu nem sequer tens um balde, e o poço é fundo: donde Te vem a água viva? Serás Tu maior do que o nosso pai Jacob, que nos deu este poço, do qual ele mesmo bebeu, com os seus filhos e os seus rebanhos?». Disse-Lhe Jesus: «Todo aquele que bebe desta água voltará a ter sede. Mas aquele que beber da água que Eu lhe der nunca mais terá sede: a água que Eu lhe der tornar-se-á nele uma nascente que jorra para a vida eterna». «Senhor, – suplicou a mulher – dá-me dessa água, para que eu não sinta mais sede e não tenha de vir aqui buscá-la». Disse-lhe Jesus: «Vai chamar o teu marido e volta aqui». Respondeu-lhe a mulher: «Não tenho marido». Jesus replicou: «Disseste bem que não tens marido, pois tiveste cinco, e aquele que tens agora não é teu marido. Neste ponto falaste verdade». Disse-lhe a mulher: «Senhor, vejo que és profeta. Os nossos antepassados adoraram neste monte, e vós dizeis que é em Jerusalém que se deve adorar». Disse-lhe Jesus: «Mulher, acredita em Mim: Vai chegar a hora em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai. Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos Judeus. Mas vai chegar a hora – e já chegou – em que os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e verdade, pois são esses os adoradores que o Pai deseja. Deus é espírito, e os seus adoradores devem adorá-l’O em espírito e verdade». Disse-Lhe a mulher: «Eu sei que há de vir o Messias, isto é, Aquele que chamam Cristo. Quando vier, há de anunciar-nos todas as coisas». Respondeu-lhe Jesus: «Sou Eu, que estou a falar contigo». Nisto, chegaram os discípulos e ficaram admirados por Ele estar a falar com aquela mulher, mas nenhum deles Lhe perguntou: «Que pretendes?», ou então: «Porque falas com ela?». A mulher deixou a bilha, correu à cidade e falou a todos: «Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Não será Ele o Messias?». Eles saíram da cidade e vieram ter com Jesus. Entretanto, os discípulos insistiam com Ele, dizendo: «Mestre, come». Mas Ele respondeu-lhes: «Eu tenho um alimento para comer que vós não conheceis». Os discípulos perguntavam uns aos outros: «Porventura alguém Lhe trouxe de comer?». Disse-lhes Jesus: «O meu alimento é fazer a vontade d’Aquele que Me enviou e realizar a sua obra. Não dizeis vós que dentro de quatro meses chegará o tempo da colheita? Pois bem, Eu digo-vos: Erguei os olhos e vede os campos, que já estão loiros para a ceifa. Já o ceifeiro recebe o salário e recolhe o fruto para a vida eterna e, deste modo, se alegra o semeador juntamente com o ceifeiro. Nisto se verifica o ditado: ‘Um é o que semeia e outro o que ceifa’. Eu mandei-vos ceifar o que não trabalhastes. Outros trabalharam e vós aproveitais-vos do seu trabalho». Muitos samaritanos daquela cidade acreditaram em Jesus, por causa da palavra da mulher, que testemunhava: «Ele disse-me tudo o que eu fiz». Por isso os samaritanos, quando vieram ao encontro de Jesus, pediram-Lhe que ficasse com eles. E ficou lá dois dias. Ao ouvi-l’O, muitos acreditaram e diziam à mulher: «Já não é por causa das tuas palavras que acreditamos. Nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é realmente o Salvador do mundo».

A Samaritana foi ao poço a uma hora em que esperava não se cruzar com ninguém. Naquele dia encontrou Jesus sentado à sua espera. Podia não ter acontecido nada, mas ela permitiu o diálogo com Jesus e isso deu-lhe a oportunidade de conhecer o dom de Deus e de se libertar de uma religião que impede os homens de se encontrarem uns com os outros em Deus. Dessa experiência nasce um movimento que coloca Jesus no centro da vida de todos os habitantes de Sicar.

Meditação da Palavra de Deus

Nos primeiros dois Domingos da Quaresma, lemos na versão de S. Marcos, o evangelista do ano, o relato das tentações no deserto (1º domingo) e a Transfiguração (2º Domingo). A partir do terceiro Domingo da Quaresma, nós escolhemos ouvir de novo os maravilhosos textos de S. João, do Ano A, que tradicionalmente preparam os adultos para o batismo a receber na vigília pascal ou à renovação do batismo para todos os que, como nós, já sendo batizados, fazemos o caminho da Quaresma.

No 3º Domingo, Cristo oferece a água-viva, no quarto Domingo, Cristo abre os olhos ao cego, e no quinto Domingo, Cristo chama de novo à vida o seu amigo Lázaro. Vamos entrar no belo texto de hoje através de 2 principais leituras; a leitura espiritual do texto e depois uma leitura prática para o hoje da nossa vida. A leitura simbólica parece ser aquela que pode conduzir-nos melhor ao centro do mistério. Para os nómadas, um poço é muito mais que um poço onde se vai à água. É um lugar de encontro, onde se conversa e se partilham experiências. É o lugar onde o estrangeiro se torna um amigo, na Bíblia o poço é também o lugar onde frequentemente se celebram os casamentos.

Ora, o poço onde Jesus encontrou a Samaritana não escapa a este dado simbólico. Como acontece sempre que S. João escreve, ele não quer nunca apenas contar um episódio. Quer levar-nos sempre mais longe. Vejamos os detalhes deste quadro tão expressivo de símbolos. A água que mata a sede é agora a Palavra deste homem misterioso. Trata-se de uma palavra maravilhosa que toca as profundezas do coração, a verdade de uma vida: «Ele disse-me tudo o que eu fiz, vinde escutá-lo». Em seguida, é também uma palavra definitiva. A Samaritana pode deixar o balde com o qual ela tirava a água do poço. Ela já não terá mais sede daquela água, já não tem mais necessidade daqueles amores que a não satisfaziam, mas a deixavam mais infeliz.

As palavras de um Deus feito homem preencheram completamente os seus anseios, a sua sede. Finalmente, o poço, lugar onde se celebravam os casamentos, tornou-se o lugar onde se declara o matrimónio espiritual: a Nova Aliança entre Cristo e a humanidade, humanidade representada, não por acaso, numa pecadora e pagã – Jesus faz entrever a adoração do Pai em espírito e verdade muito para além das querelas entre povos e religiões. Não será, diz Jesus, nem em Jerusalém, nem no monte Garizim; a verdadeira adoração acontecerá sempre que alguém se voltar para Deus com um coração reto.

Leitura prática. É talvez a leitura que nos conduz melhor ao centro do real. Este evangelho que meditamos ilumina evidentemente a nossa vida quotidiana. Hoje, como ontem, Jesus faz brotar a água-viva da sua Palavra em plena Samaria dos pagãos, dos heréticos, dos impuros. Quem vos parece que poderão ser, hoje, estes Samaritanos e estas Samaritanas que o Evangelho nos pede para acolher? Não será talvez aquela familiar divorciada que a família rejeita? Não poderá ser aquele ou aquela colega de trabalho ou de estudo para quem não ousamos olhar fixamente? Ou o crente de outra religião? Ou alguém que é suspeito por causa das suas ideias, da sua raça, da sua orientação sexual, das suas ideias políticas ou simplesmente do seu estranho aspeto físico?

Além disso, a Samaria está em cada um de nós. Quer dizer, há cristãos que desesperam deles mesmos: «A minha vida é inconsistente», «a minha vida está demasiado desordenada, é um caos». «Fiz muitas asneiras na vida»; «Deus não me pode amar». Caros irmãos e irmãs, não esqueçamos a Boa Nova do evangelho da Samaritana. Jesus propõe a água viva da sua Palavra a todos os homens e mulheres, a começar pelos Samaritanos e Samaritanas que vivem ao nosso lado. Isto é uma Boa Notícia, um Evangelho que pode mudar a nossa vida.

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